Eva regressou a casa depois do mau presságio que sentiu e da
tempestade que invadiu as ruas. Adiou, por agora, o encontro com Eduardo.
Despiu o casaco cinzento e abandonou-o no sofá. O seu ego estava tão
acinzentado como a cor daquela peça de vestuário. Olhou ao redor e viu-se
envolvida numa solidão deprimente.
Alexandre, mais uma vez disse que trabalharia até tarde
devido às reuniões do partido e, consequentemente, não teria horas decentes para
chegar a casa.
No escritório, Eva trocou umas palavritas, meramente
profissionais, com Madalena. Apesar das suas desconfianças em relação à colega
de profissão, tratou-a com uma certa frieza cordial.
Pressentia que, naquele momento, o seu marido estava envolto
nos braços da amante.
O apartamento do “lar doce lar” de Alexandre e Eva tinha uma
decoração requintada, exemplo de bom gosto. A cozinha, local onde permaneciam
mais tempo juntos, estava equipada de uma maneira prática e funcional. A
simbiose dos tons azuis e amarelos distribuídos por aquele espaço transmitiam
harmonia, porém Eva vivia uma vida incolor.
Após o duche quente e rápido, Eva estava menos preocupada
com os pensamentos negativos, parecia até que a água tinha ajudado a lavar
parte dos seus tormentos. Mais aliviada, foi até à cozinha, aqueceu o seu “take
away” e ali jantou na companhia do seu gato Teco que, carinhosamente, se esfregava
nas pernas da sua dona e esta retribuiu com uns toques leves no pelo macio
deste animal. Afinal este era o seu único amigo fiel naquela casa.
Do outro lado da cidade ficava o apartamento de Madalena
rodeado de árvores fabulosas e à frente tinha uma praceta enfeitada com um
jardim asseado e verdejante. Ali mesmo estava o carro de Alexandre estacionado.
Madalena acabava de preparar a mesa de jantar para dois e
Alexandre abria uma garrafa de vinho verde branco 2010.
- Vamos fazer um brinde! -disse Alexandre elevando o copo de
cristal, abanando o néctar dos deuses e acariciando os ombros de Madalena.
- Um brinde ao nosso amor!-retorquiu Madalena com um brilho
resplandecente no olhar que pareciam duas lanternas acesas a evidenciar o amor
a transbordar do coração.
Alexandre fixou o olhar nos belos olhos de Madalena e ali
permaneceram intactos como se o mundo tivesse parado por um instante.
Seguidamente, envolveram-se nos braços um do outro, beijaram-se apaixonadamente
e deixaram cair os corpos, como se fossem um só, sobre o sofá. Duas personagens
como Romeu e Julieta, cegos de paixão!
Eva para disfarçar a solidão daquela casa, pegou no
telemóvel e verificou se tinha mensagens novas. Nada de novo, ninguém valorizava
esta mulher, sentia-se um ser humano indiferente a todos; este era o sentimento
que Eva nutria pelo resto da humanidade. Num gesto rápido, manuseou de novo o
telefone e foi aos contatos pesquisar o nome Eduardo. Observou intensamente
este nome e, por breves momentos, sente a sua mente aliviada e a ansiedade acalmou.
Teve a sensação de ter expulsado todas as mágoas cá para fora como acontece com
aquelas conversas em que só se precisa de um bom ouvinte para apaziguar as
tristezas.
- Hoje já é tarde… mas amanhã vou-lhe ligar….Que te parece
Teco?-disse Eva, em tom baixo. Olhou para o seu animal de estimação e, como se
fosse possível, ficou à espera de uma resposta afirmativa!
O gato miou e Eva soltou uma pequena gargalhada!
- Vou tomar uma atitude! Hoje vou deixar de ser tomada como
lorpa…- gaguejou Eva ao olhar, mais uma vez, ternamente para a sua única
companhia.
Decidida em pôr um ponto final às mentiras e à vida dupla do
marido foi até ao quarto, vestiu umas calças justinhas e uma camisola às riscas
preto e branco que faziam com que a silhueta magra e esbelta de Eva
sobressaísse. Indubitavelmente tinha um corpo feminino que fazia roer de inveja
a muitas mulheres.
Tranquilamente, pegou nas chaves do carro e disse um “adeus”
afetuoso para Teco. Saiu com o objetivo de se deslocar até à casa da suposta
amante do marido. No trajeto simulou vários discursos: ou entraria de forma
violenta invadindo o apartamento e discutiria como uma estouvada chamando à
atenção dos vizinhos ou falaria civilizadamente com aqueles dois traidores,
exigindo o divórcio.
O trânsito estava caótico e os constantes semáforos a
sinalizar a luz vermelha deixavam Eva impaciente e com aquele nervosismo
miudinho que provoca suores frios.
Cortou à esquerda e entrou na praceta do prédio de Madalena.
Lá estava o carro do marido estacionado… Alexandre estaria a fazer tudo, menos
participar numa reunião do partido… Eva não conseguia controlar as batidas
aceleradas do coração.
Parou o carro e pensou: - vou tocar à campainha e faço-me de
convidada indesejada ou faço-lhe uma espera aqui mesmo, como se fosse uma
polícia à espera do sequestrador?!
Sónia Ferreira
Peixeirada eminente??? :) Ok, fica tudo em aberto para mais uma cambalhota.
ResponderEliminarXiiii... será que vem uma cena daquelas de arrancar cabelos? :) Acho que o João J. A. Madeira é a pessoa indicada para nos dizer.
ResponderEliminarGostei do desenrolar da história e da maneira de escrever. Gostei do pormenor da Eva falar com o gato...
ResponderEliminarSónia, continua a escrever, vais muito bem. Parabéns!
Parabéns Sónia, gostei do desenrolar da história.
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