- Depois da próxima rotunda, vire à direita - indicou
Patrícia, num tom de voz que oscilava entre um nervosismo miudinho irritante, e
uma ansiedade e medo inexplicáveis. – É … uma rua deserta, estreita … e íngreme
… de sentido único! – Gaguejou.
Estavam finalmente prestes a sair da longa avenida que lhes
parecia interminável. As dunas, ao fundo, cresciam grotescas à medida que o
táxi onde seguiam, se aproximava do ponto de viragem. Pareciam querer barrar-lhes
o caminho e aprisioná-los nos abismos das suas gargantas sem fundo.
- Que raiva! – Murmurava Vasco, impaciente, entre dentes. - Apanhamos
os vermelhos todos! Nem de propósito!
Patrícia, inquieta, olhava regularmente o trânsito à sua
volta, na tentativa de descobrir algum carro suspeito, pois a hipótese de
estarem a ser seguidos, não estava totalmente posta de parte. O facto de terem
saído pelas traseiras nada garantia que não pudessem ter sido vistos e que, por
isso, estivessem em segurança.
E depois se alguém os perseguia, descobriria, por fim, a
existência da filha que, ao que lhe parecia, ainda ninguém suspeitava, dado que
Patrícia, meses antes, tinha tudo planeado para o momento em que o seu estado
de grávida não desse mais para ser ocultado.
Assim, sob o pretexto de cuidar da mãe em estado crítico de
uma doença incurável, pediu licença sem vencimento por tempo indeterminado e
ausentou-se da cidade, para não mais ser vista até à altura certa de entrar de
novo em cena.
Até àquele momento, Patrícia pensava que não dispunha de
informações suficientemente relevantes sobre Duarte que fizessem dela um alvo a
perseguir ou a abater. Até essa altura, Patrícia achava que Duarte ainda não se
tinha envolvido a sério em negócios tortuosos e obscuros. No seu inocente entender,
o espírito ambicioso, aventureiro e inconsequente de Duarte começava apenas a
dar os primeiros passos, agora que se libertara dela, grávida.
Isto era o que pensava Patrícia, mas depressa Duarte deu-lhe
a saber que as suas vidas corriam perigo, dada a sua envolvência com
traficantes, lavagens de dinheiro e outras paradas ilícitas, por isso, Patrícia
teria mesmo de sair da cidade, antes que fosse tarde demais. Ele, por sua vez,
arranjaria o lugar certo para ela se ausentar, com a promessa de que no dia do
nascimento da bebé, ele tentaria estar presente e sempre que pudesse, pois
amava-as.
Assim a separação de ambos, apesar de dramática, acabou por
ser vista como natural e os seus planos também à primeira vista pareciam ter
resultado… até ao dia em que Duarte desapareceu e Patrícia se vê atirada para
as malhas de uma imensa teia de perigos que desconhece, culminando com o
aparecimento de Vasco.
Patrícia sentia-se vulnerável e frágil ao pensar em tudo isto.
De repente, parecia que o mundo lhe tinha caído todo em cima. Envolvida num
jogo duplo com Giuseppe, na tentativa de recolher o máximo de informação para
descobrir o seu amor, acabava forçosamente por se envolver com o seu cunhado
Vasco e por se ver ameaçada de morte por ambas as partes.
Chegados ao fim da rua estreita, viraram novamente à direita,
passaram por cima de uma ponte, contornaram pequenas rotundas e percorreram ruas
que se entrecruzavam, num verdadeiro labirinto que confundiu Vasco de tal forma
que este voltou agarrar o braço de Patrícia, ameaçando-a de que se o estava a
enganar ou a confundir, não sairia dali viva.
Finalmente, o táxi parou, por ordem de Patrícia, num bairro
amistoso, de varandas floridas e portinholas de madeiras de um castanho-escuro
que contrastava harmoniosamente com a brancura das fachadas das casas, todas
elas duplex.
No parque em frente, Eliana brincava com outras crianças, na
companhia de Celine, irmã de Patrícia.
Enquanto Patrícia apontava com o dedo a sobrinha que Vasco
tanto ansiava conhecer, o telemóvel dela dá sinal de mensagem escrita.
Era Giuseppe.
Fátima Veloso
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