Fotografia: Dina Rodrigues |
Sara – 2º Esq.
Depois de ter passado dois anos muito
conturbados, por causa da pandemia COVID-19, a nível social, económico e
pessoal, virei uma página da minha vida e fui viver para outra cidade.
Trabalho no atendimento ao cliente, numa
empresa de venda e assistência técnica a equipamentos de escritório. Como
muitas outras, a empresa não aguentou a crise durante a pandemia e fechou o
escritório na cidade onde eu trabalhava. Disseram-nos que os trabalhadores iam
ser transferidos para a sede da empresa, noutra cidade, mas que ninguém ia
ficar sem emprego. Quem não quisesse ir, receberia o subsídio de desemprego.
A princípio, fiquei muito receosa, sem
saber o que fazer da minha vida. Nunca tinha estado desempregada e assustava-me
ficar nesta situação, aos quarenta anos. Por um lado, era bom não ter horários
a cumprir, mas por outro lado, passar muito tempo em casa, só a limpar,
cozinhar e a passar a ferro, não era a vida que queria para mim. O meu casamento
não estava nada bem, já discutíamos por tudo e por nada e agora, infelizmente,
ia ficar desempregada!
O pior aconteceu. O meu casamento, também
não resistiu a mais uma crise e acabou em divórcio. Não havia mais nada a fazer.
Dadas as circunstâncias, decidi aceitar a proposta da empresa e comecei a
procurar uma casa na cidade da sede. Além de mim, no meu escritório, mais ninguém
quis ser transferido, todos quiseram ir para o desemprego. Como eu não tinha
muito dinheiro, não podia comprar uma casa nem pagar uma renda muito alta. Depois
de tanto procurar, encontrei uma casa com uma renda acessível, num prédio
antigo, mas com bom aspeto para se viver.
Mudei-me com a minha gata Tuxa, com
lágrimas nos olhos, mas munida de muita coragem e sem olhar para trás. Fui
iniciar uma nova vida, numa cidade estranha, sem conhecer ninguém. Só conhecia a
voz e os nomes dos meus colegas, mas acreditava que ia ser feliz e contava com o
apoio deles para esta nova fase da minha vida.
Nesta cidade, passei a fazer teletrabalho
e só vou ao escritório, uma ou duas vezes por semana. A cidade é mais pequena,
tudo é mais perto e eu passei a ter mais tempo livre. Ao fim de semana, vou à
praia passear e quando o tempo está bom, aproveito para dar um mergulho.
Durante a semana, no final do dia, às vezes vou fazer uma caminhada, outras
vezes, nas tardes quentes de Verão, gosto de beber uma imperial, acompanhada de
uns salgadinhos ou de umas amêijoas, na Esplanada do Lago, na praceta, em
frente ao prédio. A praceta, não é uma praceta qualquer, tem um grande jardim, com
estatuetas e um lago com patos, é muito agradável, para passear e relaxar.
Foi nesta esplanada que já conheci algumas
das minhas vizinhas. Conheci a Tina, a minha vizinha do lado, uma senhora muito
simpática e sempre disponível para o que eu necessitar. Até já aproveitei para
lhe deixar a chave de casa, num dia em que vinham contar a eletricidade e eu
tinha de ir ao escritório. Conheci a Cristina, do 5º Dto., muito divertida, também
divorciada e com uma filha muito bonita, com o mesmo nome que eu. Passámos algumas
tardes bem divertidas, entre conversas, risos, copos e petiscos.
Algum tempo depois de cá estar a viver,
num dia em que fui trabalhar para o escritório, ao entrar em casa, deparei-me
com uma situação algo estranha. Entraram na minha casa, alteraram a canalização
da cozinha e a disposição da máquina de lavar roupa. Agarrei logo no telefone e
liguei para o senhorio.
- Boa tarde, fala a Sara do 2º Esq., o
que é que aconteceu na minha casa, porque é que entraram cá, sem eu estar, para
mudaram a máquina de lavar de lugar?
- Boa tarde D. Sara, estava a cair água
no andar de baixo e a sua vizinha ligou-nos a pedir para resolvermos o problema
– disse ele, como justificação.
Noutro dia, cheguei a casa e tinha a
casa inundada de água. Segundo me disseram os vizinhos, rebentou um cano no meu
apartamento e tiveram de chamar os bombeiros para fechar a água. Coitada da
minha vizinha de baixo, mal me conhecia e eu já lhe estava a causar tantos
problemas. A água era tanta que ela tinha alguidares em cima da cama para a
apanhar. Estávamos as duas muito chateadas com toda esta situação. Ajudei a
Rosa a secar o resto da água e depois, também, fomos secar e limpar a minha
casa.
- Lamento muito o sucedido, peço imensas
desculpas pelo transtorno que lhe causei, mas eu também não tenho culpa de que
a canalização esteja em tão mau estado!
- São imprevistos que acontecem, é
muito chato, mas esperemos que não fique nada estragado. A culpa, não é sua, é
do senhorio que não faz obras – respondeu ela, a tentar acalmar-me.
A canalização da minha casa não é o único
problema, deste prédio. As pombas, também são um problema. À conta delas, a
vizinha de cima, do 3º Esq. já me estragou três camisolas, que estavam a secar
no meu estendal. Fui bater à porta dela a dizer o que tinha acontecido e ela
pediu-me muitas desculpas. Disse que andava a lavar o peitoril das janelas com lixívia,
por causa das cagadelas das pombas e deve ter saltado lixivia, para fora, sem
querer.
Os dias, aqui, nunca são monótonos. Há
dias, tive de ir, outra vez, tocar à porta da vizinha de cima, porque estava
uma peça de roupa caída em cima do meu estendal. Quem me abriu a porta foi um
rapaz, em troco nu, enrolado numa toalha e ainda com gotas de água a escorrer
pela pele. Eu nunca o tinha visto aqui no prédio, fiquei tão atrapalhada, sem
saber o que fazer, perguntei se aquela roupa era deles, entreguei-a e saí logo
de seguida pelas escadas.
Os meus dias são passados assim, sem
grande stress, entre teletrabalho, um café rápido à hora de almoço, as idas ao
escritório e alguns lanches na esplanada, no final do dia. Fui muito bem
recebida pelos novos colegas de trabalho e não me arrependo nada de ter mudado
de cidade. Ainda conheci poucos vizinhos, mas gosto de cá viver. Vejo que é um
prédio sossegado, pelo menos, até agora, mas está a precisar de algumas obras
de restauro!
Um dia, estava na esplanada do lago,
com a Tina, a vizinha do 2º Dto e apareceu lá um homem, mais ou menos da minha
idade, moreno, de olhos verdes.
- Sara, este é o Lourenço, o meu
sobrinho que vive no Algarve, solteiro e bom rapaz!... Vem passar uns dias
comigo – apresentou-o, ela, toda orgulhosa.
Simpatizámos logo um com o outro. Convidei-o
para se sentar connosco, conversámos bastante e depois fomos dar um passeio à
beira-mar. Ficámos amigos e depois disso, encontrávamo-nos muitas vezes na
esplanada para tomar café ou a ver os jogos de futebol da Seleção. Ele soube
dos meus problemas com a casa e convidou-me para ir passar uns dias de férias,
na casa dele, no Algarve.
Devido a tantos problemas com a
canalização, cheguei a acordo com o senhorio, para ele fazer as obras, enquanto
eu ia de férias.
Deixei ficar a minha gata Tuxa, em casa
da Tina, pedi-lhe para regar as minhas plantas, fiz as malas e lá fui eu de
férias para o Algarve!
Dina Rodrigues
Fecha-se uma porta, abre-se uma janela
ResponderEliminarFique descansada vizinha. Eu vou dar conta de tudo. É aproveite o sol do Algarve e as caminhadas a beira mar. Olhe que o meu sobrinho é uma joia de pequeno e vai divertir-se muito com ele.
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