-
Vasco?!? – Que estás a fazer? Larga-me, gritou Patrícia assustada, ao acordar
com o toque frio da arma na sua nuca.
-
Vá, minha querida, agora é tempo de explicares direitinho mas direitinho mesmo,
qual é o teu papel nesta história! Não vim cá para fazer papel de palhaço nem
para ser enganado por uma catraia como tu! – Disse vermelho de cólera Vasco,
cuspindo as palavras bem perto do ouvido de Patrícia.
Maldito
dia em que Duarte tinha tido a ideia de se mudar para o Brasil, pensava Vasco
enquanto sacudia a cabeça de Patrícia numa fúria desenfreada. Mas Duarte sempre
fora assim. Aventureiro, rebelde e um pouco inconsequente. E curioso, sempre
tinha sido Vasco a safá-lo de todos os problemas que Duarte arranjava.
E
novamente, Vasco tinha vindo tentar salvar o irmão…Se não fosse tarde demais
já…
-
Fala minha cabra, fala de uma vez. Diz-me lá como é que o Giuseppe te paga para
lhe dares informações sobre as minhas investigações – vociferou Vasco.
-
Não sei de que falas – titubeou Patrícia, debatendo-se contra as mãos pesadas
de Vasco. Como podes acusar-me de uma coisa destas, se tudo o que tenho feito é
para te ajudar? Eu não dou informações nenhumas ao Giuseppe, pelo contrário… Eu
tenho conseguido informações valiosas para te ajudar!
-
Sim, sim, não penses que me continuas a enganar. Eu vi a mensagem no teu
telemóvel – e dito isto, Vasco encostou com mais força a arma, já carregada,
agora bem perto do crânio de Patrícia.
-
Não é nada disso. Deixa-me explicar por favor. Eu também quero descobrir o
paradeiro do Duarte. Muito mais do que tu podes pensar. Eu estou fazer jogo
duplo com o Giuseppe. Eu não te estou a enganar, juro. Juro pela saúde da tua
sobrinha Eliana! – Respondeu já a chorar Patrícia.
Ao
ouvir isto, Vasco largou-a em cima da cama e virou-a para cima, olhos nos
olhos.
-
O que é que disseste? Sobrinha? O que é que estás a inventar agora, não penses
que te safas assim! – Vociferou novamente Vasco.
-
É verdade, a minha filha é tua sobrinha, filha do teu irmão. Tem dois anos e
adora o pai. Acima de tudo é por ela que o quero encontrar, porque sei que ele
ainda está vivo. Eu sei! – Soluçou Patrícia.
Vasco
saiu de cima dela e começou a andar aos círculos no quarto. Uma filha! Duarte
tinha uma filha e ninguém sabia. Nem a mãe deles, que Duarte tanto adorava. Mas
a verdade é que Duarte pouco falava da vida dele no Brasil e as notícias que
dava não eram assim tão frequentes, enviava bastantes encomendas com presentes
para a mãe e para as suas irmãs, e por vezes, para o próprio Vasco, mas nunca
dizia muito nos telefonemas e emails que trocavam.
Seria
possível Patrícia estar a falar a sério? Seria mesmo verdade?
-
Explica lá essa história de uma vez mas acho bem que estejas a dizer a verdade,
não estou com paciência nem tempo para mais mentiras. Se sei que me estás a
enganar, eu juro que te enfio uma bala no meio dessa testa linda – gritou Vasco
empunhando a arma bem na direcção da cara de Patrícia.
-
Por favor, pousa essa arma. Eu estou do teu lado, acredita. Ou melhor do lado
do Duarte, pai da minha filha. Vá, senta-te aqui e eu conto-te tudo. – Suplicou
Patrícia.
E
Patrícia começou a contar como tinha conhecido Duarte numa festa há três anos e
que tinha ficado logo encantada por aquele sotaque tão portuguesinho, como ela
dizia. Rapidamente tinham-se envolvido e tinham chegado mesmo a viver juntos.
Patrícia nunca aprovara a ambição de Duarte e a vontade dele em ganhar mais e
mais dinheiro. Nunca tinha achado bem a ligação dele com Giuseppe mas Duarte
tinha-se tornado cego a conselhos mais racionais. A avidez de dinheiro e poder
tornaram-no mais frio, mas não apagaram a sensibilidade que Duarte trazia
consigo. Quando se separaram e um mês mais tarde Patrícia descobriu que estava
grávida, Duarte fez questão de a apoiar em tudo e de acompanhar a sua gravidez
o mais perto possível.
-
Vasco, havias de ver o olhar doce do teu irmão quando ele pegou na Eliana pela
primeira vez. Parecia um anjo deliciado com aquele bebé nos braços.
Vasco
sorriu ao lembrar-se desse olhar tão característico do irmão, um olhar a que
ninguém conseguia ficar indiferente.
-
Não voltamos a ficar juntos – continuou Patrícia – mas ficamos sempre perto um
do outro. O Duarte estava sempre com a filha e continuamos amigos.
Conversávamos muito mas as conversas sobre o andamento dos negócios começaram a
ser cada vez mais escassas. Sempre que eu perguntava como iam as coisas, Duarte
desconversava. Comecei a ficar cada vez mais preocupada mas não havia nada que
eu pudesse fazer. Com o desaparecimento de Duarte, um pedaço da minha vida ruiu…
E eu não quero que a minha filha cresça sem pai. Isso não pode acontecer – e
dito isto, Patrícia começou a chorar intensamente.
Vasco
estava muito confuso. Aquela que ele pensava ser uma cúmplice de Giuseppe
afinal era mãe da sua sobrinha.
-
Leva-me já a ver a miúda. E é bom que ela exista mesmo, senão iremos voltar
aqui para continuarmos a nossa conversinha. E dá-me o teu telemóvel, não confio
em ti…ainda… - ordenou Vasco.
Vestiram-se
rapidamente e saíram do apartamento. Patrícia avisou que tinham de ter cuidado.
O Ford Fiesta iria estar à espreita para
os seguir. Assim tinham sido as ordens de Giuseppe.
-
Ah, afinal sabes muito bem quais são as ordens desse filho da mãe? - Disse
Vasco apertando-lhe o braço.
-
Tem calma, disse Patrícia. Agora vais ver a tua sobrinha e depois de finalmente
acreditares que não te estou a mentir, conto-te o resto!
Patrícia
agarrou pelo braço de Vasco e levou-o pela porta dos fundos onde poderiam
apanhar um táxi. Não podiam sair no carro de nenhum deles, pois assim iam
segui-los e a última coisa que Patrícia queria era que descobrissem que tinha
uma filha e onde moravam.
Pouco
tempo depois, o táxi seguia pela avenida fora, seguindo as direcções que
Patrícia ia dando.
Carolina Lemos
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