26/10/11

A Década De Todas As Suspeições - Parte 17


Sobressaltada, Susana recua daquele beijo que inicialmente tinha tudo para ser perfeito. Precisava de respostas. Sentia-se perdida. Quem era afinal aquele Quasimodo que acabara por se transformar num príncipe? Levantou-se e recuou alguns passos, mantendo alguma distância daquele homem de olhar doce.

— Quem és tu? Quem são estas pessoas? Porque estão aqui prisioneiras? Porque têm o meu rosto e do Paulo? Porque colocaste uma câmara no meu quarto? — Pergunta Susana de rompante sem respirar um segundo.

— O meu nome é António! Senta-te aqui por favor, tenho muito para te contar — Disse António com a voz mais doce e suave que Susana ouvira nos últimos tempos.

Susana acedeu ao pedido de António e sentou-se a seu lado, sem receios. Afinal se ele lhe quisesse fazer mal não a tinha ajudado duas vezes, pensou Susana.

— Há alguns anos atrás, estava eu a trabalhar na UCI do Hospital Santa Maria, quando fui chamado para uma reunião de urgência com o director do Hospital. Sem grandes rodeios disse-me que me tinha recomendado para um trabalho numa clínica privada. Falou-me pouco da clínica e do trabalho a realizar. Em poucas palavras disse-me que iria receber cinco vezes mais do que estava a receber na altura e não precisava acumular serviços em outros hospitais nem em consultórios. Eu respondi-lhe que precisava pensar e seria agradável ter uma entrevista com o dono da tal clínica. Sempre gostei de trabalhar na UCI e a ideia de passar os meus dias numa clínica privada atrás de uma secretária não me agradava muito. 

— Então disseste que não?! — Perguntou Susana ansiosa por saber mais sobre aquele homem que a fascinava de todas as maneiras. 

— Não tive essa hipótese! Assim que o director percebeu a minha hesitação em aceitar aquela oferta, que aos olhos de muitos seria perfeita, encostou-me à parede dizendo que ao ter feito a minha recomendação saberia que eu não o ia deixar ficar mal visto e se por algum patético motivo eu tivesse essa presunção, encarregar-se-ia de que nunca mais tivesse um emprego em nenhum outro lugar. 

— Foste coagido a aceitar o trabalho! — Completou Susana cada vez mais curiosa.

— Achei que não tinha alternativa. Ele era um homem muito influente, daqueles a quem todos fazem para agradar e ninguém se atreve a contrariar. Eu era ainda um médico recém-formado, sem currículo e sem nome. Acabei por dizer-lhe que teria todo o gosto em aceitar a oferta. Pensei naquele emprego como algo provisório e que possivelmente me abriria outras portas no futuro. Estava tão enganado... — Lamentou António de lágrimas nos olhos.

Susana comoveu-se com ar sofrido de António e chegou-se um pouco mais a ele agarrando-lhe uma das mãos. Como era quente e delicada aquela mão. De repente perdeu-se nos seus pensamentos e desejou que aquela mão ficasse colada à sua para sempre. Ainda sem saber quem era ao certo aquele homem, sentia-se protegida junto dele ao mesmo tempo que sentia um arrepio a percorrer-lhe todo o corpo.

— Estás a acompanhar-me? — Pergunta António com um sorriso doce ao perceber que Susana estava tão perto mas ao mesmo tempo tão longe.

— Desculpa! Continua por favor! — Respondeu Susana num misto de surpresa e embaraço. 

— Como te estava a dizer, no dia a seguir, às 9h00 em ponto, estava na morada que ele me tinha dado, escrita à mão num pedaço de guardanapo. Por momentos pensei que estava enganado porque naquele lugar não havia nenhuma referência a qualquer clínica ou consultório médico. Era um prédio antigo, na baixa de Lisboa. Estranhei tudo aquilo mas resolvi tocar para o 1.º frente. A porta abriu-se sem que ninguém perguntasse absolutamente nada. Lembro-me que na rua não passava ninguém e o silêncio que imperava era de certa forma constrangedor. Entrei com algum receio e comecei a subir aquelas escadas velhas e íngremes. Parece que ainda consigo ouvir o ranger daqueles degraus de madeira marcada pelo passar dos anos. 

— Estás a deixar-me nervosa com tanta descrição! — Disse Susana impaciente largando-lhe a mão!

Após um breve sorriso António continuou a sua história que parecia saída de um filme de suspense.

— Quando cheguei ao primeiro andar uma das portas estava entre-aberta. Entrei e à minha frente vislumbrei uma sala que parecia saída de uma daquelas revistas de decoração. Atrás de uma secretária de tampo de vidro impecavelmente arrumada, estava uma jovem que me pareceu demasiadamente arranjada e bem vestida para recepcionista de um consultório médico. 

António foi interrompido pelo toque do telemóvel de Susana que esta trazia no bolso das calças. Ainda assustada com aquela interrupção inesperada, Susana levanta-se para ver quem lhe estava a ligar àquelas horas. Era a sua amiga Isabel. Certamente acabara de chegar a sua casa e viu o bilhete que Susana lhe deixara na porta. Decidiu não atender. Se contasse a Isabel que estava ali, naquela casa, ao lado do homem a quem horas antes tinha arremessado um frasco de vidro Isabel pensaria que ela estava definitivamente louca.

Enquanto António prossegue com a sua descrição um tanto ao quanto aborrecida Susana perde-se nos seus pensamentos e começa a dissertar em voz alta.

— Se eu não falar com a Isabel ela vai ficar apavorada e vai ligar para a polícia. Vou ligar-lhe já!

Isabel atende o telefone de imediato e sem dar tempo a Susana de dizer o que quer que seja diz-lhe que já ligou para a polícia e que a qualquer minuto devem estar a chegar a sua casa. Susana desliga o telefone sem responder à amiga e agarra as mãos de António com ar preocupado.

— Ainda não sei quem és, ainda não percebi o que fazes aqui mas gosto de ti e confio que não me queres mal! — Disse com ar aflito.

— O que te disse a Isabel? — Perguntou António.

— Ela chamou a polícia! Não tarda estarão em minha casa! Não teremos muito tempo até que cheguem aqui porque a Isabel esteve aqui comigo esta tarde... Não quero que nada de mal de aconteça! Para onde Vamos? — Pergunta Susana com desejo de nunca mais se separar de António.

Susana Fonseca

1 comentário:

  1. Hum... novamente, romance.Estará Susana pré-destinada a amores complicados? Gostei do rumo que deste à história, Susana!

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