12/01/24

Caminhos e Encruzilhadas - Capítulo 10



Estrela

As cores do sol dissolviam-se sobre o mar deixando as ondas alaranjadas. Caminhei por mais de 2 horas até conseguir sentir as areias da praia de Figueira da Foz coçarem a pele dos meus pés. Contemplo o horizonte marítimo enquanto o vento fresco atravessa meu corpo, carregando com ele uma estranha sensação de nostalgia, que já esperava fosse me atingir. Por um instante, sentia que não era a Estrela de agora, mas a de há anos atrás. Fecho os olhos e deixo a aragem percorrer minha pele e bagunçar meus cabelos negros. Quantos anos faz afinal? Em algum lugar do passado estive aqui com Marcelino, em uma época em que a felicidade parecia ao alcance de nossas mãos. Eu era apenas uma jovem que não entendia quase nada da vida. Diferente de agora, que sou uma mulher adulta e pareço entender dela ainda menos. Como disse antes, há muitos jeitos de amar e de uma certa maneira, eu e Marcelino nos amamos intensamente. Porém, às vezes a estrada fica difícil e o caminho estreito e no final nem sabemos quem está deixando quem ir embora.

Agora aqui de novo, olho para tudo isso. A areia debaixo dos dedos, as ondas do oceano lambendo a praia, os pássaros marinhos mergulhando atrás dos peixes, o vento cortando o rosto, o sol clareando tudo. Tudo parece tão igual. Tão simetricamente igual. Porém, tudo me soa tão estranho agora, como se eu não pertencesse a nada disso. Será que Marcelino sentiria a mesma sensação?

Caminho pela areia rememorando quando estivemos aqui a primeira vez. Lembro de quando já entardecia, Marcelino estava no mar, então começou a chover. Gotas grossas caiam sobre as ondas. Marcelino veio correndo até a areia onde eu estava em pé. Eu ia dizer para irmos embora por causa da chuva, quando ele me surpreendeu com um beijo. Foi um beijo forte, espontâneo, e pude sentir a areia de seus lábios salgando minha boca enquanto a chuva encharcava nossos corpos. Fomos correndo de mãos dadas até a casa em que estávamos. Tomamos banho e quando anoiteceu fizemos amor na varanda, ouvindo Patti Smith e o assoalho de madeira ranger debaixo de nós.

Sorrio lembrando disso tudo. Porém, preciso voltar para o presente, único lugar que me pertence. Respiro fundo e me recordo que estou indo ver Adriano. Então uma ponta de insegurança machuca meu peito e sinto borboletas no estômago. Não sou mais aquela jovem. Será que ele vai gostar do que o tempo me tornou? E será que minha alma cansada ainda pode sentir a paixão ardendo por dentro?

Então, como por um sinal divino, olho para o lado e um rapaz moreno de ombros largos e camisa florida me encara fixamente. Meu olhar esbarra nele por um instante e ele deixa escapar um leve sorriso malicioso para mim. Não sei quantos anos ele tem, mas deve ser metade dos meus. Devolvo a gentileza do sorriso com outro. Me viro e vou caminhando lentamente para longe da praia. Preciso seguir meu caminho e ele leva a Adriano e tudo que pode acontecer depois de todos esses anos.

A essa altura, antes de continuar, cabe agora indagar a pergunta que me trouxe aqui. Estou mesmo livre do passado e dos sentimentos que um dia tive por Marcelino, a ponto de seguir em frente? Minha resposta diante disso só pode ser: com certeza!

Meu coração estranhamente palpita e meu corpo parece entrar em ebulição interna. Percebo que minhas memórias daqui são recortes bonitos de um tempo bom. Porém, meu desejo e meus anseios não estão no passado e sim no porvir. Não iniciei essa longa jornada e cheguei até aqui para me reencontrar com o passado e sim para me encontrar com o futuro e de braços abertos lhe abraçar e acolher.

Com isso em mente, continuo rumo a meu encontro com Adriano, pois a nós dois pertence esse futuro. Futuro incerto, é verdade, mas quem tem certeza de alguma coisa nessa vida?

 

                                                         Grégor Carlos Marcondes

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