Fiquei desolada com a morte de Alípio… que
morte trágica! Era uma pessoa tão generosa, tão amiga do próximo! Que
infortúnio… não merecia tamanha atrocidade…
O Alípio foi para mim um porto de abrigo num
momento conturbado da minha vida…jamais esqueço o dia em que bati à porta do seu
escritório, com a minha filha Carminho, de seis meses, ao colo a pedir-lhe
emprego. Fui recebida tão amavelmente como se nos conhecêssemos há longos anos…senti,
a partir daquele momento, que Alípio acolheu-nos como pessoas próximas da sua
família.
Alípio, estou com o meu coração a sangrar
de tanta tristeza…eu considerava-te um Herói aqui neste planeta!
Trabalhei contigo, como tua secretária,
durante estes últimos vinte anos e tu eras um verdadeiro líder motivador e não
um patrão rabugento…
Aprendi tanto contigo Alípio! Aprendi,
através da tua escrita, a analisar várias perspetivas numa determinada
situação, aprendi a refletir sobre o que escrevias, bem como a encarar o
quotidiano com uma atitude positiva, face às adversidades da vida…
Alípio, o teu escritório foi o meu local
de trabalho e também foi a creche da Carminho! A minha situação de família
monoparental, sem qualquer tipo de ajuda económica do pai da minha filha,
tocou-te no coração…foste um “tio padrinho” fora de série da Carminho!
Hoje, eu e a Carminho sentimo-nos
desprotegidas com a tua ausência…choramos de saudades tuas e de revolta pelo
sucedido…
Quem me dera apanhar a pessoa que te fez
isso…era capaz de “fazer justiça com as próprias mãos” …
Nos últimos meses, todas as vezes que aquele
homem, com cerca de cinquenta e cinco anos, alto, magro, de cabelos grisalhos
que escondiam as rugas da testa, vinha ao teu escritório eu sentia que esta
visita não era de uma pessoa de bem… Aquele ar enfadonho combinava com a pasta
preta de cabedal, desgastada pelo tempo, que o acompanhava. Reparei que a pasta
tinha uma fechadura e um aloquete sempre bem fechada a “sete chaves” … O que
guardaria de sigiloso aquela pasta no seu interior?
Sempre que este senhor António vinha ao
escritório, Alípio fechava-se com ele no interior do gabinete, para abordarem
temas que me deixavam extremamente curiosa…
Uma vez ou outra tentei aproximar-me da
porta para tentar ouvir o que discutiam, porém, não tive coragem de fazer tal
acto por achar que estava a trair a confiança pessoal e profissional de Alípio.
A minha ética profissional e os meus valores morais nunca me permitiram
transgredir as regras de “escutar atrás da porta”. No entanto, na verdade, até
me arrependo de não ter tentado ouvir as vossas conversas demoradas.
Após a saída deste senhor do gabinete de
Alípio, eu sentia que o meu patrão e amigo ficava perturbado e em silêncio o
resto do dia.
Qual seria o tema daquelas reuniões
demoradas? Todas as vezes que estas tertúlias ocorriam, o Alípio avisava-me,
atempadamente, que não queria ser incomodado nem interrompido por ninguém.
Eu sentia um mau presságio em relação
àquele homem sempre que se trancava com o Alípio naquele gabinete, com as
persianas corridas abaixo, sem deixar entrar a luz natural. Aquele ambiente de
luz ofusca combinava com a fisionomia do senhor António e com o ar sombrio de
Alípio após a saída deste indivíduo.
Sónia
Ferreira
Faço votos de que o aparecimento deste precioso texto, signifique que a nossa amiga Sónia já se encontra bem de saúde. Excelente desenvolvimento do tema, que aumenta o mistério da morte do homem que todos tinham na maior estima.
ResponderEliminarPobre Alípio... o que será que o deixava tão sombrio após essas reuniões a portas fechadas??
ResponderEliminarMistério!
Excelente, Sónia!!! Parabéns!!!
Havia quem tivesse reuniões assim com uma senhora.
ResponderEliminarAcredito que o tema fosse diferente :))
Boa semana
Gosto que se sinta melhor, Sónia e desejo que se recupere rapidamente. Então o Alípio tinha encontros secretos? É este homem da pasta está na lista dos suspeitas da morte do Alípio? A história promete. Terá o Alípio sido morto ou morreu de morte natural? Tantas interrogações vão levar-nos longe. Parabéns Sónia.
ResponderEliminarGostei do que li nos dois posts.
ResponderEliminarO conto é um género maior das letras.
Muito boa tarde!
a aguardar a explicação de alguns mistérios!
ResponderEliminargostei do texto